ENCONTROS DO OLHAR

Fotografia e Arte

Desenho, pintura, fotografia;

a produção de imagens como actividade humana

Luís Fortunato Lima

Quinta-feira

19 de Abril

21h30

Instituto Português de Fotografia

Porto






Luís Fortunato Lima

Nasceu no Porto em 1976, onde vive e trabalha.

Em 2002, licenciou-se em Artes Plásticas, vertente Pintura, pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto.

É pós graduado em Práticas e Teorias do Desenho, e, actualmente, prepara a dissertação de Mestrado em Práticas e Teorias do Desenho, na FBAUP.

Expõe regularmente desde 2003. Paralelamente à actividade de Artista plástico – pintor é docente de Desenho na Faculdade de Arquitectura Porto




Desenho, pintura, fotografia; a produção de imagens como actividade humana

A vastidão de abordagens possíveis ao tema obriga a uma escolha, a uma posição e a um olhar sobre o que é e o que comporta a imagem.

Nesta apresentação, a imagem, surge como um fenómeno; um resultado da necessidade, da vontade e da capacidade do ser humano propor e aceitar representar. Será abordada produção das imagens no desenho, na pintura e na fotografia.

Relativamente a imagens provenientes do campo artístico serão abordadas as suas origens (as alegorias, a história e o seu legado), a problemática da mimésis (a partir da percepção, interpretação e registo do real concreto) e a ‘imagem’ da imagem (que nos permite produzir e pensar aspectos do desenho, da pintura e da fotografia).

Paralelamente à conferência será apresentada uma mostra de imagens fotográficas que constituem registos auxiliares da produção pictórica de Luís Fortunato Lima.




Encontros do Olhar - Fotografia e Arte

Ao longo de oito conferências, os diferentes convidados provenientes de áreas como a história da arte, a crítica de arte, a curadoria e a criação artrítica no campo das artes plástica e da fotografia, apresentarão a sua visão sobre a importância e a presença da fotografia no período contemporâneo e as relações que a fotografia estabelece com as diferentes áreas da criação artística.




O programa

2006

02 Novembro 21h30 _ Fotografia na arte por Ricardo Nicolau

07 Dezembro 21h30 _ A obra de Rita Castro Neves por Rita Castro Neves

2007

04 Janeiro 21h30 _Jovens Fotógrafos por Liliana Coutinho

01 Fevereiro 21h30 _ Fotografia e arte contemporânea:

o papel crítico da fotografia no campo artístico

por Sandra Vieira Jürgens

01 Março 21h30 _ A obra de André Cepeda por André Cepeda

19 Abril 21h30 _ Desenho, pintura, fotografia; a produção de imagens

como actividade humana por Luís Fortunato Lima

03 Maio 21h30 _ João Tabarra

13Junho 21h30 _ Miguel von Hafe Pérez






Programação: José Maia

Organização: IPF - Porto

Informações: José Maia | Tel.: 93 32 88 141

encontrosdoolhar@gmail.com

Entrada gratuita




Iinstituto Português de Fotografia _ Porto

Rua da Vitória, nº 129 _ 4050-416 _ Porto _ Portugal

Telefone 22 332 68 75

ipf.porto@ipf.pt

www.ipf.pt







A OBRA de Luís Fortunato Lima

Não tenho memória deste lugar - Suburbano

Luís Fortunato Lima

Luís Fortunato Lima tem desenvolvido um corpo de trabalho que compreende a pintura e o desenho.

Os espaços, lugares e objectos são registados fotograficamente e reinterpretados num desenho realista, rigoroso e preciso que permite ao artista empreender um levantamento das transformações do lugar onde nasceu, na periferia do Porto.

Enquadrada na clássica temática paisagem, a obra pictórica de Fortunato Lima estabelece múltiplas relações com o passado da pintura.

Em termos temáticos e formais remete-nos ao início do século XVII, período em que o realismo emerge novamente e se assiste ao aparecimento de uma nova forma de pintura, período em que artistas holandeses e flamengos, a trabalharem em Roma, começam a pintar cenas da vida quotidiana, cenas de rua, em quadros de dimensões reduzidas.

Se os referidos artistas, nas viagens ao Sul, representavam aspectos das regiões campestres, como pequenas torres sobre penhascos rochosos, pontes sobre perigosas ravinas e picos alpinos, paisagens em que os objectos eram representados com definição e com cores locais brilhantes onde dominava o castanho no primeiros planos, o verde nos intermédios e o azul nos fundos; nas paisagens de Fortunato Lima, a periferia da cidade do Porto é representada pela luz do nascimento ou do ocaso do sol que unifica a linha do horizonte. As cores escuras dominam o primeiro plano enquanto o plano intermédio é compostos por elementos como ruínas, torres e sequência de construções arquitectónicas que nos conduzem a um plano distante, tenuemente iluminado.

A luz que ilumina as paisagens e alguns dos elementos que as constituem, deixa o primeiro plano, o plano do observador na obscuridade; permitindo ao artista representar a descaracterização da paisagem da cidade do Porto mais especificamente: o apagamento da ruralidade do Porto com a invasão de construções em betão e o domínio do padrão urbano.

O interesse pelas zonas rurais dos arredores da cidade, enquanto motivo e objecto de representação, encontra na história da pintura uma relação com o trabalho de artistas franceses que no período referido trabalhavam em Roma e se inspiravam nas zonas rurais do litoral napolitano.

No início do século XVIII a designação de «Paisagem Urbana» era associada a uma imagem realista de Veneza, mesmo que a paisagem representada resultasse da soma de duas ou mesmo mais vistas. No final do mesmo século, em Itália, as paisagens urbanas tornaram-se populares. Realizadas no estúdio do artista, a partir de desenhos registados no próprio local, por vezes com a utilização de uma câmara escura, os desenhos, constituíam um espólio de imagens que poderiam servir uma ou mais pinturas durante um curto ou longo período de tempo, mesmo que o edifício ou outro elemento representado tivesse roído ou oculto. Hoje, algumas pinturas são consideradas arqueologicamente correctas e outras mais fantasistas. Do processo criativo de Fortunato Lima, também, faz parte a criação de um espólio de imagens, (registadas não com a utilização de uma câmara escura mas de uma câmara fotográfica,) que são reinterpretadas pictoricamente e que constituem uma espécie de levantamento arqueológico do lugar onde nasceu, mais concretamente, e segundo as suas palavras um levantamento da “zona compreendida entre as Antas e o vale de Campanhã; (…) espaços derivados da implantação da Via de cintura interna no Porto, que criou uma espécie de zona/fronteira de recantos que encerram poucas referências à sua identidade passada e à dos que o habitam ou habitavam.”[1]

Antes da transposição da imagem fotográfica para pintura, o artista, reenquadra, recompõe a imagem adicionando ou subtraindo elementos. A gama cromática é trabalhada digitalmente ou alterada no processo de impressão da imagem fotográfica ou ainda alterada no processo realização da pintura.

Em termos cromáticos, as paisagens tonalizadas de Lima, (pintadas com uma cor e a gradação muito estreita de subtis modulações de tom – tom sobre tom – com pequenas quantidades de cores fortes, utilizadas para realçar pormenores e orientar o olhar,) criam efeitos atmosféricos da luz e definem sombras ou zonas de sombra que permitem ao artista representar a sua visão do real e a condição existencial contemporânea.

Os contrastes fortes de luz e sombra, as cores escuras que caracterizam os espaços atravessados pela luz e cores penetrantes e vivas, as pinceladas utilizadas na obtenção de um efeito brilhante; permitem ao artista conferir um tratamento dramático ao tema e expor a sua visão pessoal e interior da realidade. Ao conferir importância à emoção e à imaginação em detrimento da lógica cerebral e racional, Fortunato Lima aproxima-se das premissas definidas pelo Romantismo no século XIX.

Ao contemplarmos a sua pintura, somos envolvidos pelo negro do primeiro plano e encontramo-nos num espaço sombrio ou, numa outra interpretação, somos remetidos para a obscuridade, para a escuridão. Em termos simbólicos o espaço exterior dá lugar a um espaço interior, a uma paisagem interior psicologicamente densa. Em termos metafóricos são imagens representativas do “lado sombrio do crescimento da cidade”[2], da subordinação desta a um modelo urbano, desumano e frio.

A luz do último plano que ilumina de forma remanescente os lugares, os objectos arquitectónicos, o mobiliário urbano ou outros objectos, torna-os fantasmagóricos, afunda-os no negro e sublinha o afastamento do homem relativamente à luz, à lucidez e aos “locais e coisas de transição que ecoam na memória qualquer espécie de reminiscência”[3]. Neste sentido, Fortunato Lima, torna-nos conscientes do divórcio com o passado, com um tempo mais iluminado, reforçando a obscuridade em que nos encontramos e permaneceremos. A invisibilidade para que tende a linha do horizonte, evidencia o declínio de crença num horizonte promissor e, por conseguinte, a falta de esperança num futuro melhor.

A componente poética, da pintura de Fortunato Lima, abre um campo de reflexão e diálogo sobre o mundo actual, opera como instrumento de liberdade inventiva e sensível que não hesita em questionar o representável, os códigos, os poderes, o real e revela a parte obscura deste último. Segundo as suas palavras, proporciona o “encontro com a consciência da constante mutação das coisas”[4], revela “obstáculos, silêncios, e abandonos (…) a sombra da civilização actual e do bem estar colectivo (…) no momento em que as referências físicas ao passado concreto terminam; num presente que se dilata entre essa referência arqueológica e o progresso” [5]

A obra de Fortunato Lima propõe-nos pensar a paisagem a partir da acção do homem sobre a natureza. As suas representações pictóricas da paisagem do Porto, são simbólicas de um tempo onde a construção e a intervenção na paisagem acontecem num ambiente estéril de reflexão crítica sobre as transformações materiais, espaciais e culturais, e consequentemente, distantes de qualquer discussão em torno da história da paisagem, da actividade humana e mais concretamente da cação do homem sobre o lugar, o espaço, e o ambiente onde vive.

Na obra de Lima já não se coloca a distinção entre paisagem natural e cultural como outrora fora sustentada. A visão do artista responsabiliza-nos pelas sofríveis transformações na paisagem e pela indecorosa acção do homem no espaço que habita, no mundo.

José Maia

10-2006



[1] Lima, Luís Fortunato – Portfólio 2002 – 2006

[2] ibid.

[3] ibid.

[4] ibid.

[5] ibid.